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Julgue

Devemos julgar? É correto condenar e acusar pessoas? Devemos criticar alguém que faz algo errado ou apoiá-la em seu erro? Existe um julgamento justo? Devemos julgar as ações dos outros, por exemplo: um fumante deve ser julgado e alertado por fumar? Devemos acusar os outros por comerem indevidamente? Assuntos polêmicos que a Escritura nos responde com sabedoria.

Mateus disse pra não julgar?

Um texto muito utilizado sobre se devemos julgar ou não é o de Mateus 7:1:

Não julgueis, para que não sejais julgados.

A palavra utilizada com o contexto de julgamento nesse texto é derivada da palavra krinō (κρίνω em grego). O seu significado, segundo Thayer e Strong, é de distinguir, decidir (mental ou judicialmente), pronunciar uma opinião a respeito de estar certo ou errado (decidir entre o bem e mal): ou seja, um julgamento, por isso é normalmente traduzida como julgar (Lucas 6:37, João 7:51, João 18:31, Atos 13:46, Romanos 2:27).

O texto de Mateus 7:1 não diz para não julgar, mas o que ocorre se você julgar, ou seja, se você julgar, será julgado. Continuando o texto, veremos que da mesma maneira que você julga, você é julgado (Mateus 7:2). Portanto, não é uma proibição de julgamento, mas sim que ao julgar você tem que se examinar antes para verificar se não está cometendo o mesmo erro ou até mais grave (Mateus 7:3,4). É um texto direcionado ao hipócrita (Mateus 7:5) que não enxerga que comete o mesmo pecado (Mateus 7:3). Entretanto, após remover a trave do olho, deixa de ser hipócrita, e assim pode remover o cisco do olho do seu irmão (Mateus 7:5). Nesse mesmo capítulo, Cristo nos orienta a julgar os falsos profetas por seus frutos, dessa maneira saberemos discernir suas ações e com isso não sermos enganados por quem pratica a iniquidade (Mateus 7:15-23). Uma lição importante é que ao invés de apenas acusar, é necessário olhar para si mesmo e só assim, mediante a um bom julgamento, auxiliar o seu irmão.

Texto semelhante encontra-se em Romanos 2:1. Paulo descreve novamente um hipócrita que julga o seu irmão e desse jeito, o hipócrita é julgado do mesmo pecado, assim como descrito em Mateus 7. Portanto, ao julgar para auxiliar, devemos cuidar para não estarmos no mesmo erro do julgamento aferido (Romanos 2:3,21,22,23) e sem fazer acepção de pessoas (Romanos 2:11).

Orientação de Deus sobre julgamentos

A instrução de Deus é justamente que não devemos fazer discriminação de pessoas, pois, somente Ele sabe o que está no coração de cada um (Salmos 44:21, Atos 1:24, 1 Samuel 16:7). Ele julga corretamente o ser humano (Salmos 96:13, Salmos 98:9), por isso, em algumas situações somente Ele pode nos mostrar a diferença entre o justo e o ímpio que podem se encontrar no mesmo povo (Malaquias 3:18). Com isso nos dá capacidades (Isaías 28:6) de não julgarmos apenas por sua origem e pela aparência, mas por julgamento justo, conforme a orientação de Cristo (João 7:24). Entretanto, é necessário discernir entre o bem e o mal (Hebreus 5:14) e afastar-se das más companhias (Provérbios 24:1, 1 Coríntios 15:33), não participar de suas más obras (1 Timóteo 5:22, 2 João 1:11) ou julgar e repreendê-lo para correção (1 Timóteo 5:20), porque o amor não suporta a injustiça (1 Coríntios 13:6). Devemos julgar principalmente os que dizem que fazem parte da igreja de Cristo (1 Coríntios 5:12), por isso, afastar-se dos hipócritas (1 Coríntios 5:11).

Julgando no Velho Testamento

Moisés julgava o povo (Êxodo 18:13) e ele ordenou homens para julgarem em seu lugar (Êxodo 18:21-26), portanto, Moisés constituiu juízes para realizar o julgamento sem discriminação considerando o juízo de Deus (Deuteronômio 1:16,17). Para o povo de Israel, havia uma congregação que julgavam as pessoas (Números 35:24). Várias pessoas julgavam outros homens por decreto de Deus: Débora, a profetisa (Juízes 4:4), Samuel (1 Samuel 7:15), Davi (2 Samuel 8:15), Salomão (1 Reis 3:9,10).

Deus confirma por Moisés (Levítico 19:1), a lei do amor ao próximo (Levítico 19:18) e que a recomendação para o povo escolhido é julgar o seu próximo com justiça (Levítico 19:15), sem ódio, entretanto, com repreensão (Levítico 19:17).

Salomão orienta que o sábio não deve ter parcialidade no julgar (Provérbios 24:23) e que o rei deve julgar com equidade (Provérbios 29:14). Deus, utilizando o profeta Jeremias também diz para casa de Israel julgar justamente (Jeremias 21:12).

Exemplo dos apóstolos e de Cristo

Os apóstolos julgavam (Atos 15:19, Atos 16:15, 1 Coríntios 5:3) e inclusive orienta-nos a julgar (1 Coríntios 10:15, 1 Coríntios 11:13, Atos 4:19), pois, devemos discernir o certo e o errado e se o espírito provém de Deus (1 João 4:1). Jesus até disse para Simão que ele julgou bem a respeito da aplicação do perdão (Lucas 7:43). Paulo nos orienta a julgar as coisas dessa vida (1 Coríntios 6:3), inclusive as coisas mínimas (1 Coríntios 6:2), e de preferência dentro da igreja (1 Coríntios 6:4,5).

Entretanto, ao julgar não devemos desprezar nosso irmão (Romanos 14:10), que é pecador como todos (Romanos 3:9-12), por isso, cada um dará conta de si mesmo a Deus (Romanos 14:12). Portanto, se ao julgar, nos tornamos pedra de tropeço, ou seja, ao invés de ajudar iremos prejudicar e afastá-lo de Cristo é melhor que não julguemos uns aos outros (Romanos 14:13). Por exemplo, se ao criticar o que seu irmão come, ao invés de fazê-lo evitar alimentos prejudiciais para o corpo que é o templo do Espírito Santo (1 Coríntios 6:19,20), irá fazer afastá-lo um dos outros e não crescer para Cristo, é melhor que não o irrite por causa do que come ou bebe (Romanos 14:3,15), ou se ele tem algum dia especial (Romanos 14,5,6, Colossenses 2:16). Entretanto, se o seu irmão é sábio e atende a repreensão e admoestação, no momento oportuno, é bom julgá-lo e repreendê-lo para o crescimento da igreja de Cristo (Hebreus 3:13, 1 Tessalonicenses 5:11-14). O objetivo da igreja de Cristo é seguirmos as coisas que servem para a paz, mas também para a edificação mútua (Romanos 14:19). Edificar o outro não significa maldisser o outro, nesse caso você não está ajudando-o a crescer, mas condenando e isso é papel do Juiz e não de um observador da lei (Tiago 4:11). Legislar e julgar com a finalidade de condenação é papel apenas de Deus, não devemos nos colocar na posição de juízes (Tiago 4:12).

A lei judaica julgava um homem (João 7:51) mediante a presença de pelo menos duas testemunhas (João 8:17). Apesar de muitos dizerem que Jesus não julgou ninguém (João 8:15), Ele afirma que quando Ele julga o Seu juízo é verdadeiro (João 8:16) e justo (João 5:30), inclusive de acordo com a lei judaica na presença de duas testemunhas (João 8:18, João 5:32), entretanto, a função de Jesus em nossa terra é para salvar e não julgar (João 12:47, João 3:17). Quem rejeita a salvação já tem quem o julgue (João 12:48), de acordo com os mandamentos dado pelo Pai (João 12:49) pelo seu Filho (João 12:50). Por isso, julgar se alguém já está salvo, não cabe a nós mesmo, pois, quem julga é o Senhor (1 Coríntios 4:4), por isso não devemos também dizer se alguém está condenado, pois, isso só será revelado quando o Senhor voltar (1 Coríntios 4:5)

Ideal do Cristão

O ideal do cristão é que a sua própria consciência o julgue e não a de outro (1 Coríntios 10:29,
1 Coríntios 11:31). Quando nos julgam, somos repreendidos pelo Senhor para não sermos condenados pelo mundo (1 Coríntios 11:32). Tudo o que fazemos deve ser para glória de Deus (1 Coríntios 10:31), e para isso não devemos servir de escândalo para os outros (1 Coríntios 10:32), para que muitos possam ser salvos (1 Coríntios 10:33). Quem de fato crê em Cristo não é julgado, pois, faz a vontade de Deus e pratica a verdade (João 3:21), mas o que não crê, já está julgado (João 3:18), pois, ama as trevas mais do que a luz (João 3:19) e pratica o mal (João 3:20).

Conclusões

É normal e comum avaliarmos e julgarmos os outros. Ao dizer que tal pessoal não deve julgar, já estamos julgando-a. Provavelmente, o próprio leitor já julgou o autor desse texto também. Entretanto, o uso de ternura e amor ao julgar os outros ao invés de severidade, com falta de compaixão fazem com que as pessoas se afastem. Portanto, devemos ter compaixão e não sermos precipitados como os amigos de Jó. Verificamos que o julgamento com a finalidade de condenação só deve ser realizado por Deus, mas o julgamento com a finalidade de discernimento e auxílio ao próximo é papel de todo cristão.

Não há dúvidas que devemos julgar, questionar, analisar, provar, examinar (Atos 17:11, 1 Tessalonicenses 5.21, Hebreus 13:9), pois, o que é espiritual julga bem tudo (1 Coríntios 2:15). Até os profetas devem ser julgados (1 Coríntios 14:29) para sabermos se as suas revelações são de Deus (1 João 4:1).

Entretanto, nosso julgamento com a finalidade de condenação será realizado por Deus (Atos 7:7, Romanos 3:6, 1 Coríntios 4:4), será segundo a lei da liberdade (Tiago 2:12) que é a Lei de Deus (Tiago 2:8,10,11), que é o Amor (2 João 1:6). Há um dia determinado para isso (Atos 17:31) e todos devemos comparecer nesse tribunal para dar conta de nossos atos e obras (Romanos 14:12, 1 Pedro 1:17), pois, somos justificados pela fé e essa fé é demonstrada pelos atos e obras feitas (Tiago 2:24,26)

Julgar sendo egocêntrico, juiz, mesquinho ou fofoqueiro é errado, os fariseus faziam isso, por esse motivo, Cristo disse o que se encontra em Mateus 7. Estar sempre pronto por discernir um defeito no outro é ser condenatório e hipócrita, pois Cristo é única norma de caráter a seguir e ninguém deve ser padrão para o outro. O objetivo de cristão é ajudar o seu semelhante, por isso, como podemos ver, discernir o certo e o errado, julgar com amor (1 Coríntios 16:14) e com a finalidade de ajudar é o ideal de todo cristão, ao invés de ser arrogante, acusar e condenar. Assim também, todo cristão que for repreendido de forma correta deve se alegrar e crescer a cada dia nas instruções de Deus.

O que rejeita a instrução menospreza a própria alma, mas o que escuta a repreensão adquire entendimento.

Provérbios 15:32