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Ensine como Cristo

Um dos pontos curiosos da história de Cristo é que ele gostava de ensinar sentado. Desde a sua infância, nos ensinos aos doutores, Ele fez isso sentado:

E aconteceu que, passados três dias, o acharam no templo, ASSENTADO no meio dos doutores, ouvindo-os, e interrogando-os.
Lucas 2:46

Um dos Seus sermões mais conhecidos, o sermão do monte, também foi feito sentado:

E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, ASSENTANDO-SE, aproximaram-se dele os seus discípulos;
E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo:
Mateus 5:1,2

Ao ensinar utilizando parábolas:

Tendo Jesus saído de casa, naquele dia, estava ASSENTADO junto ao mar;
E ajuntou-se muita gente ao pé dele, de sorte que, entrando num barco, se ASSENTOU; e toda a multidão estava em pé na praia.
E falou-lhe de muitas coisas por parábolas, dizendo: Eis que o semeador saiu a semear.
Mateus 13:1-3

No sermão profético, feito pouco antes de Sua morte e olhando para o templo:

E, estando ASSENTADO no Monte das Oliveiras, chegaram-se a ele os seus discípulos em particular, dizendo: Dize-nos, quando serão essas coisas, e que sinal haverá da tua vinda e do fim do mundo?
Mateus 24:3

No barco:

E, entrando num dos barcos, que era o de Simão, pediu-lhe que o afastasse um pouco da terra; e, ASSENTANDO-SE, ensinava do barco a multidão.
Lucas 5:3
Novamente Jesus começou a ensinar à beira-mar. Reuniu-se ao seu redor uma multidão tão grande que ele teve que entrar num barco e ASSENTAR-SE nele. O barco estava no mar, enquanto todo o povo ficava na beira da praia.
Marcos 4:1

No ensino sobre quem é o maior no reino dos céus:

ASSENTANDO-SE, Jesus chamou os Doze e disse: “Se alguém quiser ser o primeiro, será o último, e servo de todos
Marcos 9:35

Ou mesmo no templo:

Ao amanhecer ele apareceu novamente no templo, onde todo o povo se reuniu ao seu redor, e ele se ASSENTOU para ensiná-lo.
João 8:2

E na sinagoga em Nazaré:

E, cerrando o livro, e tornando-o a dar ao ministro, ASSENTOU-SE; e os olhos de todos na sinagoga estavam fitos nele.
Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos.
Lucas 4:20,21

Entretanto, nas sinagogas havia uma cadeira que ficavam na parte da frente.

Cadeira do Moisés de Corazin

Essa cadeira era chamadas de “Cadeira de Moisés”. Era costume ler a Lei e os Profetas (escrituras) em pé e sentar-se nessa cadeira para pregar. Era em uma cadeira como essa que falavam também os escribas e fariseus (Mateus 23:1-3). Essa prática de se assentar em cadeiras para para falar ao povo era uma prática de Moisés (Êxodo 18:13) e, por isso, na época de Cristo, essas cadeiras tinham esse nome.

Embora Cristo, provavelmente, sentou-se na cadeira de Moisés em uma sinagoga para ensinar (Lucas 4:20), Ele repreendeu quem almejava mais o título do que a função de servir (Mateus 23:6-12). O problema não era sentar na cadeira, mas o desejo de ser visto como mais importante que os outros (Mateus 23:5).

Hoje em dia também temos a noção de que um mestre ensina sentado. A palavra cátedra, que é atribuído a um professor que chegou no grau mais alto de docência e conhecimento, portanto, apto a ensinar, tem origem do latim cathedra e significa cadeira. Esse mesmo título é utilizado por autoridades religiosas importantes e é à partir dessa expressão que surgiu o nome catedral como o lugar onde se tem um cátedra. Por exemplo, para a igreja católica, na basílica de São Pedro, temos a Cátedra de Pedro (Cathedra Petri – Cadeira de Pedro) que é utilizado como trono pelos papas. Quando um papa senta nessa nessa cadeira, a teologia católica diz que ele é infalível e, esse momento é chamado de: ex cathedra, que significa, “à partir da cadeira”.

Vemos que Cristo, em Seus ensinos, fazia diferente do convencional, Ele não subia em lugares elevados e nem em cadeiras ou tronos com o propósito de se exibir. Ele sentava em barcos, no chão, se aproximava e trazia nova luz para verdades que haviam sido distorcidas por outros. Esse costume também foi seguido por seus discípulos (Atos 16:13). Podemos observar que na simplicidade e até mesmo sentados podemos iluminar pessoas com o conhecimento revelado por Cristo.

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Leve Compaixão

A palavra compaixão no dicionário de língua portuguesa, significa dor que nos causa ao ver o mal sendo feito ao nosso próximo ou participação da dor alheia com o intuito de dividi-la com o sofredor. A etimologia da palavra tem origem do latim: compassionem da raíz compati, que possui a seguinte composição: com (junto) + pati (paixão, sofrer). Veremos que embora a origem da palavra compaixão em nosso idioma tenha um sentido interessante, nas escrituras esse sentimento tem origem em um significado físico e importante para o entendimento correto.

Origem no grego

Embora alguns acreditem que, nas escrituras, a palavra que foi traduzida para compaixão venha da composição de com + πάθος (transliterado pathos), assim como ocorre no latim e no português, essa inferência não é correta. A palavra pathos e suas derivada como pathe (πάθη) e pathei (πάθει) nas escrituras são sempre associadas com paixões depravadas e afeições negativas. Podemos encontrar nos seguintes versículos:

Por isso Deus os abandonou às paixões (πάθη) infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza.
Romanos 1:26

Em Romanos, as paixões infames são associadas à homossexualidade (Romanos 1:27).

Mortificai, pois, os vossos membros, que estão sobre a terra: a fornicação, a impureza, a afeição (πάθος) desordenada, a vil concupiscência, e a avareza, que é idolatria;
Colossenses 3:5

Em Colossenses, a afeição desordenada não deve fazer parte do cristão (Colossenses 3:6).

Não na paixão (πάθει) da concupiscência, como os gentios, que não conhecem a Deus.
1 Tessalonicenses 4:5

Em Tessalonicenses à paixão da concupiscência pode ser vista pelo próprio versículo que são associadas às pessoas que não conhecem a Deus.

Portanto, não é adequado a afirmação da mesma construção que temos em latim. Há uma possibilidade de uma forma alternada que é a palavra πάσχω (transliterada: paschó). Entretanto, essa palavra é associada com sofrimento e não compaixão, ternura ou piedade (por exemplo: Mateus 16:21, Mateus 17:12, 2 Timóteo 1:12).

Nas Escrituras – As entranhas contorcidas

Um exemplo claro e bom de compaixão encontramos num relato de Mateus, também descrito em João, sobre a chegada de Jesus em Tiberíades, situado às marges da Galileia (João 6:1):

E, Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e possuído de íntima compaixão para com ela, curou os seus enfermos.
Mateus 14:14

Jesus atraia várias pessoas que sentiam necessidade de cura (João 6:2) e posteriormente fome (Mateus 14:20). A multidão era em torno de cinco mil homens, além das mulheres e crianças (Mateus 14:21). O mesmo sentimento é demonstrado por Jesus em outras situações, onde as multidões andavam cansadas e desgarradas (Mateus 9:36).

A expressão de íntima compaixão, se fosse traduzida literalmente, significaria ter as entranhas contorcidas, movidas em amor, o que expressa um pouco do sentimento que Jesus teve. A palavra compaixão nesse texto, em grego, é ἐσπλαγχνίσθη (transliterado: esplanchnisthē), também sinônimo de σπλαγχνίζομαι (transliterado: splagchnizomai), deriva da palavra σπλάγχνα (transliterado: splagchnon) e significa literalmente entranhas, vísceras (intestinos, coração, rins, pulmões, …). É utilizado tanto para os componentes físicos, como na morte de Judas Iscariotes (Atos 1:18) ou para sentimentos (por exemplo: Lucas 1:78, 2 Coríntios 6:12, Colossenses 3:12, 1 João 3:17). Figurativamente, as entranhas eram o local das emoções. Temos também expressões equivalentes no hebraico: quando José viu seu irmão Benjamim (Gênesis 43:30), no episódio do Salomão com duas mães e um filho, onde a mãe verdadeira ficou comovida (1 Reis 3:26) ou quando Deus se comoveu com Efraim (Jeremias 31:20).

O sentimento visceral associado às entranhas é utilizado até para expressar paixão e amor (Cânticos 5:4). Paulo também fala sobre afeição associada às entranhas (Filipenses 1:8, Filipenses 2:1, 2 Coríntios 7:15), inclusive em alguns trechos, se forem lidos de maneira literal sem associar à interpretação de entranhas como sentimentos, fica um pouco estranho como, por exemplo, nos seguintes versículos:

Porque temos grande gozo e consolação do teu amor, porque por ti, ó irmão, as entranhas dos santos foram recreadas.
E tu torna a recebê-lo como às minhas entranhas.
Sim, irmão, eu me regozijarei de ti no Senhor; recreia as minhas entranhas no Senhor.
Filemon 1:7,12,20

Compaixão de Deus no Velho Testamento

Mesmo com a desobediência (Juízes 2:17), Deus se mantém misericordioso, amoroso e compassivo (Juízes 2:18), ouvindo o clamor e gemido de quem sofre (Êxodo 2:23-25). Em várias situações, Deus demonstrou a mesma compaixão (2 Reis 13:23, Isaías 54:7,8,10) que Jesus mostrou quando veio como humano (Filipenses 2:8).

Deus se compadece como um pai de seus filhos que o temem (Salmos 103:13) e, quando estamos arrependidos, Ele se esquece dos nossos pecados (Miquéias 7:18,19). Há diversos exemplos sobra a compaixão de Deus para com o ser humano (Joel 2:18, Deuteronômio 32:36, Isaías 14:1, Salmos 86:15, Salmos 72:12,13, Salmos 78:36-39, …) desde a eternidade (Salmos 25:6).

Ação para o próximo

É interessante notar como o sentimento pode ter implicações físicas a ponto de agir sobre as vísceras. Pedro, também diz como devemos nos sentir associando a misericórdia com o sentimento visceral (entranhavelmente).

E, finalmente, sede todos de um mesmo sentimento, compassivos, amando os irmãos, entranhavelmente misericordiosos e afáveis.
1 Pedro 3:8

Prometer e dizer que está orando pela pessoa e não fazer isso de coração, a sua oração se torna abominável (Salmos 66:18, João 9:31), entretanto, a oração de um justo, pode muito em seus efeitos (Tiago 5:15,16). Para poder agir com compaixão de modo a minimizar o sofrimento alheio é necessário seguir alguns passos: observar (1 João 3:17), ouvir com mansidão (Juízes 2:18, Gálatas 5:22, Colossenses 3:12-14) e agir (Mateus 14:14).

Apenas se lamentar pela situação ou dizer que sente muito, não são características da compaixão e sim da indiferença, falta de fé (Tiago 2:15-17) e falta de amor (1 João 3:17). Ao notificar a morte de uma pessoa, ao conversar com pais de alguém que tirou a própria vida, ou mesmo ao ver alguém enfermo, que possamos sentir nossas vísceras retorcerem dentro de nós e nos motivar a agir para amenizar as dores do nosso próximo. Cristo praticava isso em toda a sua vida. Ao ver uma mãe que perdeu seu único filho, Cristo sentiu suas entranhas retorcerem (moveu-se de íntima compaixão) e além de fornecer uma palavra de conforto para a mãe (Lucas 7:13), ressuscitou seu único filho (Lucas 7:14). Com esse exemplo, podemos ver, que amenizar a situação com palavras de conforto e agir, na medida do possível, para resolvê-la, são características da verdadeira compaixão (2 Coríntios 1:3,4), que nos faz inclusive se entristecer e chorar (João 11:35, Romanos 12:15).